AZAGAIA DESCREVE DISCO DE MC K
Proibido ler isto
Agora que começaste vai até ao fim... disse para mim mesmo depois de
apertar o play e deixar o novo CD do McK rolar. De certeza que não sou o único
que gosta do proibido, eu e toda a raça humana somos assim. Proibir é acender
uma chama no frio, ela queima mas aquece. Ainda bem que logo na primeira faixa do
disco o K tranquiliza-nos quando diz que se trata de Fogo Amigo. E é disso
mesmo que se trata, McK, por trás da Trincheira de Ideias que já nos habituou,
abre fogo em nome da justiça, paz e liberdade e diz que está de volta na caminho de luta depois de 5 Anos de
Ausência.
O álbum começa muito bem para quem esperou 5 anos por ele. Com uma sessão
rimada de explicações e esclarecimentos, afinal meia década de ausência é
suficiente para alimentar boatos, rumores, e mal entendidos, McK leva-nos aos
assuntos proibidos de Angola, de África e do mundo, mostrando-nos que embora afastado,
esteve sempre atento. Acredito que foi com essa atenção que ele percebeu o que
há Por Detrás do Pano num som profundo e arrepiante com a ajuda das vozes vibrantes
de Beto de Almeida e Ângela Ferrão, na faixa 3. A mim pareceu-me um recado para
uma Angola emergente onde por mais que a vida brilhe como diamantes para alguns
e como lágrimas para muitos, no fundo todos os angolanos são iguais e sensíveis
às fatalidades da vida, daí a necessidade da união para além dos bens
materiais, bens esses que, segundo o K, são também o fundamento da Teologia da
Prosperidade que multiplica falsos profetas na terra das Palancas. Já agora,
também aqui no país da Marrabenta. E falando em país, na quinta faixa
percebemos com quantos Nomes, Rimas e Palavras se fazem os podres dum país. Tudo
isso por cima dum beat ácido de Sam The Kid que, curiosamente, foi produzido na
noite de natal de 2009 na casa do McK com o MPC do Boni da Diferencial. Eu
estava presente na hora e foi o natal mais under
da minha vida. Jesus nasceu ao som de beats e rimas.
Nzala é o nome da faixa que McK faz com Paulo Flores, uma música sem flores
e cheia de lágrimas. Conta uma daquelas histórias sem final feliz. Daquelas que
os africanos bem conhecem e só as contam para que nunca mais se repitam. Nzala,
que significa fome, é filha da guerra que não acabou para todos, principalmente
para as crianças das ruas de Luanda. E porque não de Maputo?! Mas é, noutro
contexto, a tentar mostrar que há espaço para a paz entre o Hip Hop e o Kuduro
que o K chama o kudurista Bruno M para largar dos versos mais lúcidos do disco
no tema Kamama ou Kuzu, ou seja, morte ou cadeia, se bem traduzo, as únicas
alternativas para quem vive no crime. No crime, ou à volta dele, estão também
prostitutas disfarçadas de funcionárias bancárias, traficantes de droga
disfarçados de empresários, maridos cornudos disfarçados de gigolos e todos
eles a viverem um racismo disfarçado Na Fila Do Banco, na faixa 8. Uma mistura
de temas proibidos que vale a pena experimentar. McK, DaBullz e Agente Supremo,
na faixa seguinte, mostram o orgulho de fazermos parte dum Circuito Fechado
onde as luzes da mídia não seduzem a ninguém. O K continua e pede paz no prato no País do Pai Banana,
coisa que, segundo o mc, é difícil num país onde todos os cachos são
controlados por 3 famílias. Continuando com as ironias, chega a vez do
Ikonoklasta juntar-se à sessão de proibição e dizer que A Bala Dói,
principalmente quando oferecida em vez da comida prometida. Quase ninguém
escapou das balas destes dois mcs angolanos. Quem também não escapou às balas
foi o próprio McK no tema Quarentona Atraente, afinal quem mata também morre. Um estória interessante sobre como pode ser
o fim dum rebelde revolucionário que porque também tem sangue nas veias, foi
alvo fácil duma espiã sedutora. Sinceramente, devia ser proibido esse tipo de
armas!
O disco acaba com o K no céu ao lado do Cheroke e outros combatentes
vítimas deste mundo onde não há espaço para santos, no tema Tou na Fronteira.
Ele bem que avisou que o álbum começava num Domingo e acabava num Sábado. Mas
como parece que até no céu o K não pararia de escrever, ainda surgem duas
faixas bónus, a Vida no Avesso e uma justa homenagem ao país deste mc no tema
Eu sou Angola. Outra justa e merecida homenagem deve, sem dúvidas, ser feita ao
produtor Boni da Diferecial, ele que foi quase que inteiramente responsável
pela banda sonora deste álbum que se continuar proibido de se ouvir, será mais
consumido que filmes porno. Bem, eu
avisei que era proibido ler isto. Óptima escuta!
Mano Azagaia
9 de Janeiro de 2012
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